Outros Papos

Você sabe votar?

Foto: pxhere

Eu achei que eu sabia.

Hoje o papo é eleição, mais especificamente, o sistema de votação brasileiro. Você sabe o que acontece com os votos brancos e nulos? Qual a diferença entre um e outro? E as abstenções, entram ou não na contagem dos votos?

Sem querer causar polêmica alguma ou polarização, este post é apenas para tirar algumas dúvidas sobre os votos brancos e nulos. Resolvi escrevê-lo porque eu mesma tinha dúvidas e, ao pesquisar sobre o tema, fiquei surpresa com o que descobri e achei interessante compartilhar.

Ontem e hoje

As designações “voto branco” e “voto nulo” vêm da época em que a votação, no Brasil, era feita por meio de cédulas de papel, ou seja, o eleitor escolhia seus candidatos escrevendo, à mão, num pedaço de papel – as cédulas, depositando-as em urnas.

Assim, votos nulos eram aqueles em que o eleitor não declarava, de modo legível, sua escolha na cédula eleitoral, ou seja, a anulava, seja rabiscando, desenhando, escrevendo frases de protesto ou um número de candidato inexistente.

Esses votos não eram utilizados na contagem da votação.

Já os votos em branco eram exatamente isso mesmo: quando o eleitor não escrevia nada na cédula, depositando-a, em branco, na urna.

Esse tipo de voto era considerado, até 1997, na contagem para o cálculo do quociente eleitoral nas eleições proporcionais, o modo como escolhemos nossos deputados federais, estaduais e vereadores. Mas não eram válidos nas eleições majoritárias, quando escolhemos o presidente da república, seu vice, governadores e prefeitos.

A nova Lei Eleitoral de nº 9.504, aprovada em 30 de setembro de 1997, mudou esta história: a partir dela, “nas eleições proporcionais, contam-se como válidos apenas os votos dados a candidatos regularmente inscritos e às legendas partidárias.” Ou seja, os votos brancos deixaram de entrar para a contagem de votos para a escolha de deputados federais, estaduais e vereadores.

Desta forma, não há mais diferença entre votos brancos e nulos na contagem de votos para escolher o candidato vencedor, em qualquer tipo de eleição, seja proporcional ou majoritária.

Nas urnas eletrônicas, ainda podemos votar em branco, apertando a tecla “Branco” no teclado ou votar nulo, digitando um número de candidato que não exista, como 000 e depois apertar a tecla “Confirma” para que o voto seja enviado. Porém, na prática, ambos são iguais, porque demonstram a falta de opção do eleitor e não entram na contagem dos votos válidos.

Voto nulo anula a eleição?

Não. Pela maneira de como é feito o sistema eleitoral brasileiro, numa eleição majoritária, o candidato que conseguir a maioria absoluta dos votos válidos (50% dos votos mais 1), leva a eleição já no primeiro turno. Se não, temos de voltar às urnas novamente, em até 20 dias, e escolher entre os dois primeiros colocados no primeiro turno.

Digamos que, numa eleição majoritária hipotética, a maioria dos eleitores brasileiros decida anular o voto, ou seja, ir às urnas e votar em branco, nulo ou simplesmente não votar, como fica? Ainda assim haveria um vencedor para tal eleição, porque só são computados votos válidos, lembra?

O que quer dizer que, se somente um eleitor dos 147,3 milhões de eleitores brasileiros resolvesse votar, seria este o voto que elegeria o próximo presidente da república da nação, que ganharia o pleito com a maioria absoluta dos votos válidos. Absurdo, não?

O que me faz pensar do porquê do voto ser mandatório no Brasil…

Num outro exemplo: numa eleição com 10 eleitores e 5 candidatos, se 9 anularem seus votos, o que receber o único voto válido ganha a eleição.

A história de que voto nulo anula eleição vem da interpretação errônea de um trecho do Código Eleitoral, o artigo 224, que diz que “se a nulidade atingir a mais de metade dos votos do País nas eleições presidenciais”. Trata-se, daí, da nulidade do voto, pela Justiça Eleitoral, caso seja verificada alguma irregularidade com aquela votação, como fraude, compra de voto. Neste caso, novas eleições seriam convocadas dentro do prazo máximo de 40 dias.

Portanto, “nulidade” é uma coisa e “voto nulo” é outra, sendo que “nulidade” não tem nada a ver com falta de quórum para que a eleição seja levada adiante.

As abstenções também ficam de fora na contagem dos votos válidos.

Votos nulos, brancos e abstenções têm poder?

É aí que está o pulo do gato. Enquanto nenhum deles têm poder para anular eleições, como já vimos, eles interferem, sim, no resultado de uma eleição, porque alteram a matemática dos votos válidos, fazendo, inclusive, com que uma eleição possa ser definida já no primeiro turno. Menor quórum, menor chance de segundo turno e menor probabilidade de diluição dos votos.

Para ilustrar, cenários com o exemplo dos 10 eleitores e 5 candidatos para eleições majoritárias:

  • 10 eleitores: se tivermos 9 votos nulos/brancos/abstenções e 1 válido – ganha o candidato que receber este único voto. Não haverá segundo turno.
  • 10 eleitores: se tivermos 8 votos nulos/brancos/abstenções e 2 válidos – ganha o candidato que receber a maioria dos votos, ou seja os dois votos. Pode haver segundo turno.
  • 10 eleitores: se tivemos 7 votos nulos/brancos/abstenções e 3 válidos – ganha o candidato que receber a maioria dos votos, ou seja, dois. Pode haver segundo turno.

E assim por diante.

Em caso de segundo turno, ganha aquele que receber a maioria dos votos. No exemplo acima, poderia haver empate técnico, mas não nas votações brasileiras para valer, porque o número de eleitores é bem maior e o vencedor será aquele que obtiver a maioria absoluta dos votos, ou seja 50% mais 1 voto.

Então, o candidato que estiver com maior intenção de votos nas pesquisas é o que vai levar o segundo turno? Não necessariamente. Primeiro, porque as pesquisas são feitas por amostragens; segundo, porque não sabemos quantos desses eleitores vão mesmo votar naquele candidato, quantos eleitores resolverão anular o voto, votar em branco ou desistir de votar. É aí que a coisa começa a virar especulação. Assim como no exemplo anterior, quanto menor o quórum, menos apertada a disputa:

  • 10 eleitores: se tivermos 9 nulos/brancos/abstenções e 1 válido – ganha o candidato que receber este único voto.
  • 10 eleitores: se tivermos 5 nulos/brancos/abstenções e 5 válidos – ganha o candidato que receber 3 votos.
  • 10 eleitores: se tivermos 0 nulos/brancos/abstenções e 10 válidos – ganha o candidato que receber 6 votos.

Entendeu? Quanto menos eleitores, mais fácil levar a eleição.

E quando o eleitor não gostar de nenhum dos dois candidatos que foram para o segundo turno? Daí ferrou.

É por isso que uma reforma no nosso sistema eleitoral se faz tão necessária, para que o descontentamento do eleitor, hoje em forma de votos brancos, nulos e abstenções, não seja só recado, mas traduza-se em atitudes concretas.

 

Referências:

http://agenciabrasil.ebc.com.br/justica/noticia/2018-09/mais-de-106-mil-brasileiros-vao-votar-em-cedula-de-papel-no-exterior

http://www.tse.jus.br/eleitor/glossario/termos/voto-nulo

http://www.tse.jus.br/eleitor/glossario/termos/voto-em-branco

http://www.tse.jus.br/legislacao/codigo-eleitoral/codigo-eleitoral-1/codigo-eleitoral-lei-nb0-4.737-de-15-de-julho-de-1965#4-tit1

https://tre-ms.jusbrasil.com.br/noticias/369411886/votos-brancos-e-nulos-nao-anulam-o-pleito?ref=serp

https://politica.estadao.com.br/noticias/eleicoes,entenda-o-que-sao-e-para-onde-vao-os-votos-nulos-e-brancos,70002374361

https://www.eleicoes2018.com/como-funciona-o-segundo-turno-das-eleicoes/

http://www.tre-pe.jus.br/imprensa/noticias-tre-pe/2016/Setembro/mitos-e-verdades-sobre-a-eleicao

https://idec.org.br/dicas-e-direitos/mitos-e-verdades-sobre-o-voto

 

 

 

 

 

 

 

 

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